Vicariato Episcopal Norte




segunda-feira, 10 de maio de 2010

Entrevista de Frei Carlos Mesters pela equipe Teologia Pública do Instituto Humanitas Unisinos

Por Graziela Wolfart - 20/10/08.
Carlos Mesters :A Palavra está presente em todos os setores da vida da Igreja. “Judeus, Cristãos e Muçulmanos, somos irmãos, filhos do mesmo pai Abraão”, considera o frei Carlos Mesters. Ao falar sobre a importância dos círculos bíblicos, Frei Carlos Mesters afirma que neles “a Bíblia se torna um espelho, no qual as pessoas descobrem dimensões mais profundas da sua própria vida que antes não tinham percebido”.
Ao falar sobre a importância dos círculos bíblicos, Frei Carlos Mesters afirma que neles “a Bíblia se torna um espelho, no qual as pessoas descobrem dimensões mais profundas da sua própria vida que antes não tinham percebido”. Para ele, na entrevista que segue, concedida por e-mail para a IHU On-Line, a importância de um sínodo sobre a Bíblia no atual momento é muito grande por vários motivos, dentre os quais “o aprofundamento que a Palavra de Deus pode trazer para a vida humana” e a percepção da “importância da presença da sabedoria de Deus na leitura que os pobres do mundo inteiro fazem da Bíblia”.

Carlos Mesters é frade Carmelita, doutor em Teologia Bíblica. É natural da Holanda e ligado à caminhada das Comunidades Eclesiais de Base, ajudou a criar o CEBI (Centro de Estudos Bíblicos). Escreveu, entre outros, Esperança de um povo que luta (São Paulo: Paulus, 1983), Círculos bíblicos (São Paulo: Paulus, 2001), Paulo apóstolo: um trabalhador que anuncia o evangelho (São Paulo: Paulus, 2002), Bíblia: livro feito em mutirão (São Paulo: Paulus, 2002), e Por trás das palavras (Petrópolis: Vozes, 2003). Mesters é assessor de um dos bispos brasileiros na XII Assembléia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, que ocorre de 5 a 26 de outubro, no Vaticano. A entrevista a seguir foi elaborada em parceria com a equipe de Teologia Pública do Instituto Humanitas Unisinos - IHU. (Já houve o Sínodo)

IHU On-Line - A leitura orante da Palavra de Deus tem tido muita difusão nas comunidades eclesiais, através dos círculos bíblicos. Qual é para o senhor a riqueza deste método e qual o seu limite?
Carlos Mesters - A riqueza deste método é que a leitura orante da Palavra de Deus provoca no povo um contato direto com a Bíblia, sem intermediários, num ambiente comunitário de fé, dentro da realidade do dia-a-dia da vida. Deste modo, vai nascendo um confronto entre Bíblia e Vida. A Bíblia se torna um espelho, no qual as pessoas descobrem dimensões mais profundas da sua própria vida que antes não tinham percebido. Você pergunta: “Qual o seu limite?”. Tudo o que é humano é limitado. Um limite aparece quando os participantes do Círculo Bíblico se fecham em si mesmos e esquecem a realidade da vida ao redor. Pois a Palavra de Deus não está só na Bíblia, mas também na Vida, na natureza, nos fatos, em tudo que acontece.

IHU On-Line - Qual é a importância de um Sínodo sobre a Bíblia no momento atual? Qual é a sua apreciação do "instrumentum laboris” para o sínodo?
Carlos Mesters - A importância de um sínodo sobre a Bíblia no atual momento é muito grande por vários motivos: 1) permite uma partilha entre os bispos, participantes do Sínodo, em torno das experiências e dos problemas no uso e na leitura que o povo faz da Bíblia nas várias partes do mundo, sobretudo nos países da América Latina, África e Ásia. Uma partilha assim enriquece a todos, ajuda relativizar os problemas e faz perceber melhor o caminho, o rumo do Espírito; 2) favorece o aprofundamento que a Palavra de Deus pode trazer para a vida humana e ajuda a descobrir melhor o alcance e o significado do documento “Dei Verbum ” do Vaticano II sobre a Revelação; 3) faz perceber a importância da presença da sabedoria de Deus na leitura que os pobres do mundo inteiro fazem da Bíblia. Isto ajudará para que a exegese científica descubra melhor qual a sua contribuição para a vida das Comunidades, para a Igreja; 4) o Sínodo sobre a “Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja” completa a caminhada iniciada no Sínodo anterior sobre a Eucaristia. Quanto ao Instrumentum Laboris, a opinião geral é de que se trata de um documento bom que está dando ao sínodo um rumo positivo. O Instrumentum Laboris é o resultado das contribuições do mundo inteiro. Mostra como a Palavra está presente em todos os setores da vida da Igreja.

IHU On-Line - Que leitura o senhor faz da presença de 25 mulheres e do rabino chefe de Haifa, Israel, Shear-Yashuv Cohen, neste sínodo?
Carlos Mesters - Acho muito importante a presença das mulheres, mas ainda é pouco. Só 25 entre mais de 200 participantes. O olhar feminino descobre e revela aspectos da Palavra de Deus que o olhar masculino não percebe, e vice-versa. Os dois olhares se completam e se enriquecem mutuamente. Limitando tudo ao olhar masculino, empobrecemos a riqueza que a Palavra de Deus poderia proporcionar às Igrejas e à humanidade. Quanto à presença do Rabino chefe de Haifa, Shear-Yashuv Cohen, ela é muito significativa e muito importante nos nossos dias. Ela nos ajuda a recuperar a memória. Não podemos esquecer nunca que Jesus era judeu, nasceu judeu, viveu como judeu e morreu como judeu. Todo o Novo Testamento é uma interpretação do Antigo Testamento à luz de Jesus. Temos muito a aprender uns dos outros. No passado, essa perda de memória a respeito da nossa origem nos levou a erros e crimes ao longo dos séculos. Recuperar a memória significa recuperar nossa identidade através do diálogo com nossos irmãos judeus. Em mim nasce o desejo de que, um dia, possa fazer o mesmo com nossos irmãos muçulmanos. Judeus, cristãos e muçulmanos, somos irmãos, filhos do mesmo pai Abraão.

IHU On-Line – Por que os livros apócrifos atraem tanto ao público? Não é tempo de fazer uma leitura de como foram selecionados os livros que hoje formam a Bíblia e revisar os que ficaram de fora?
Carlos Mesters - Acho que não há o que revisar. Os livros chamados apócrifos atraem porque são considerados proibidos. Tudo que é proibido atrai. Na realidade, nunca foram proibidos. Apócrifico quer dizer que estes livros não fazem parte da lista oficial. Deveriam ser chamados de livros “não-canônicos”. É bom notar que os livros apócrifos mais tardios, escritos entre o século V e VIII, têm uma tendência anti-semita, o que não é bom. É deplorável. Alguns chegam quase a considerar Pilatos como um homem honesto que foi enganado pelos judeus para condenar Jesus. Isto não corresponde à verdade histórica.

IHU On-Line - Que hermenêuticas o senhor apontaria como importantes, hoje, na leitura da Palavra, para não cair em fundamentalismos, literalismos ou leituras ideológicas?
Carlos Mesters - Todas as hermenêuticas que ajudam o povo a descobrir a presença da Palavra de Deus na vida são importantes: a hermenêutica feminina, a negra, a indígena, a leitura que os pobres fazem da Bíblia, enfim, tudo que faz a gente olhar os textos com um olhar a partir da realidade das pessoas. Resumindo, acho importante seguir os três passos do método ou da hermenêutica que Jesus usou com os discípulos na estrada de Emaús. O primeiro passo: aproximar-se das pessoas, escutar sua realidade e seus problemas; ser capaz de fazer perguntas que as ajudem a olhar a realidade da vida com um olhar mais crítico (Lc 24,13-24). O segundo passo: com a luz da Palavra de Deus iluminar a situação que os fazia sofrer e os levou a fugir de Jerusalém para Emaús; usar a Bíblia para fazer arder o coração (Lc 24,25-27). O terceiro passo: criar um ambiente orante de fé e de fraternidade, onde possa atuar o Espírito que abre os olhos, faz descobrir a presença de Jesus e transforma a cruz, sinal de morte, em sinal de vida e de esperança. Assim, aquilo que antes gerava desânimo e cegueira, torna-se luz e força na caminhada (Lc 24,28-32). O resultado do uso da Bíblia é o de criar coragem e voltar para Jerusalém, onde continuam ativas as forças de morte que mataram Jesus, e experimentar a presença viva de Jesus e do seu Espírito na experiência de Ressurreição (Lc 24,33-35). O objetivo último da Leitura Orante da Bíblia ou da Lectio Divina não é interpretar a Bíblia, mas sim interpretar a vida. Não é conhecer o conteúdo do Livro Sagrado, mas, ajudado pela Palavra escrita, descobrir, assumir e celebrar a Palavra viva que Deus fala hoje na nossa vida, na vida do povo, na realidade do mundo em que vivemos (Sl 95,7); é crescer na fé e experimentar, cada vez mais, que “Ele está no meio de nós!”
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domingo, 2 de maio de 2010

Estudo do profeta Jonas para o Mês da Bíblia 2010

Desde o Vaticano II, a Bíblia ocupou um espaço privilegiado na família, nos grupos de reflexão, círculos bíblicos, na catequese e nas pequenas comunidades. A Igreja no Brasil desenvolveu toda uma prática de leitura e reflexão da Bíblia que muito contribui para o sustento da fé e da caminhada das pessoas. É uma forma muito rica de viver a missão da Igreja que é a de servir a Palavra.
O Mês da Bíblia surgiu há 39 anos por ocasião do 50º aniversário da Arquidiocese de Belo Horizonte. Desde então tem destacado a importância da leitura, do estudo e da contemplação das Sagradas Escrituras. Na verdade, o Mês da Bíblia contribuiu muito para o desenvolvimento da Pastoral Bíblica no âmbito paroquial e diocesano. Hoje, se percebe a necessidade da Animação Bíblica das Pastorais em vez da existência de apenas uma pastoral entre as demais dedicada às Sagradas Escrituras. A Animação Bíblica vem a ser a forma mais adequada de acentuar a centralidade da Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja.
A Comissão Episcopal Pastoral para a Animação Bíblico-Catequética, juntamente com as Instituições Bíblicas, no desejo de dar continuidade à XII Assembléia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos (2008), que destacou especialmente o mandato missionário de todo cristão como consequência do batismo, propõe para o ano de 2010, no mês da Bíblia, o estudo e a meditação do Livro de Jonas com destaque para a evangelização e a missão na cidade.
O Sínodo pediu que a consciência desse mandato missionário e discipular fosse aprofundada em cada paróquia e comunidade, nas pastorais, nos movimentos e nas organizações católicas. Também foi desejo dos Padres Sinodais que se propusessem novas iniciativas para se fazer chegar a “Palavra de Deus a todos, especialmente, aos irmãos batizados, mas não suficientemente evangelizados” (Proposição 38).
Além disso, a V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe, em Aparecida - SP (2007), também destacou o valor do mandato missionário, enfatizando os novos areópagos da missão (DAp 491-500). Areópago, literalmente, significa colina de Ares, localizada na antiga cidade grega de Atenas. Nesse lugar, a céu aberto, a cidadania era exercida em assembleias que tratavam de importantes assuntos no âmbito da política e da religião. Foi ali, conforme At 17, 16-33, que São Paulo apresentou o Evangelho, pela primeira vez, a um ambiente de cultura grega. Atualmente, o areópago, em sentido simbólico, significa os novos contextos de missão. Os encontros sobre o livro de Jonas ajudarão a Igreja a vivenciar o mandato missionário no enfrentamento de novos desafios.
Na linha do ecumenismo da Campanha da Fraternidade deste ano, o livro de Jonas reforça a idéia da universalidade do amor de Deus, que reconhece o valor de todos; no horizonte aberto pelo Ano Paulino, esse texto da Escritura nos faz refletir sobre a evangelização do mundo urbano. Assim, Jonas será uma grande contribuição para que o entusiasmo não esfrie e a Igreja possa continuar ampliando sua reflexão sobre a amplitude de sua missão. De fato, a escolha deste livro bíblico para o mês de setembro tem por objetivo tirar os católicos do comodismo e do julgamento preconceituoso e os encaminhar para a evangelização da cidade.
Existem muitas formas de se aproximar da Sagrada Escritura, porém, existe uma privilegiada à qual todos somos convidados: o exercício da Leitura Orante (Lectio Divina) da Sagrada Escritura que, se bem praticada, nos conduz ao encontro com Jesus (Cf. DAp 249).
Por isso, escolhemos esta forma de contato com a Palavra de Deus para este mês da Bíblia. Agradeço à Aíla Luzia Pinheiro de Andrade, da Comunidade Nova Jerusalém, pela elaboração deste subsídio.
Que o estudo e a meditação do livro de Jonas nos ajudem a vencer a tentação de fugir dos desafios da missão e nos tornem capazes de acolher a todas as pessoas sem acepção.

Dom Eugênio Rixen Bispo de Goiás - GO
Presidente da Comissão Episcopal Pastoral
para a Animação Bíblico-Catequética
Fonte: CNBB